Hoje
fui fazer uma radiografia dos pulmões, porque estou com falta de ar já há algum
tempo. Já pesquisei sobre o significado emocional desse sintoma físico e o que
fica para mim é a dificuldade de me relacionar com a vida. Inspirar e expirar.
O ar me conecta com o mundo, com todos os seres e eu tenho dificuldade de fazer
isto. Medo de viver? Do que tenho medo? Medo de sentir a dor do mundo.
Desde pequena,
sempre fui uma criança sensível e pareço ver coisas que os outros não veem, ou
talvez, sentir coisas que os outros não sentem. Com o tempo, descobri que isso
é uma qualidade dos piscianos. A “pequena pisciana”, uma vez eu li num texto de
astrologia, e isso me soou como se eu fosse uma “criatura frágil”, parecida com
aqueles seres estranhos dos contos de fada, com orelhas grandes, olhos
profundos e corpos magros. Sendo assim, nunca pude expressar o que via, o que
sentia, porque os adultos nem sempre dão bola para as crianças.
Mas meu mundo
interior sempre foi muito vasto e eu sentia necessidade de compartilhar isso,
de entender, de expressar, elaborar. Com o tempo, percebi que o mundo interior
não era algo muito valorizado na sociedade, não era falado, abordado, ensinado.
E, aos poucos, fui entendendo que não podia falar sobre isso. E fui silenciando
em mim essas vozes internas, meu mundo rico e fantástico, cheio de tanta
beleza. Aprendi desde muito cedo a dizer e fazer as coisas certas para ser
aceita, para poder existir.
Quando escrevi
isto agora, eu chorei, como se estes “seres” que habitam esse espaço interno
(ou externo também), pudessem finalmente respirar. Não havia ar para eles lá
dentro, pois estavam trancafiados. Hoje eu abri esta porta, essa passagem de
ar, o canal de ligação, a conexão com esse mundo. Eu me vejo de novo, eu me
sinto! E choro muito. Choro muito por me encontrar depois de tantos anos
afastada de mim mesma.
Esta noite
sonhei com uma dança, um espetáculo. Eu e uma criança pequena, delicada, bela,
dançávamos juntas, completamente “encaixadas”, integradas uma a outra. Era como
se deslizássemos em um piso acetinado e formássemos uma bela dança, em perfeita
harmonia de movimentos. Quando terminamos a dança, eu a levantei no colo e a
coloquei em uma bancada e ela quis falar. Mas os adultos não quiseram ouvi-la.
Esse sonho é
muito revelador deste momento da minha vida, mas também do que já foi. A dança
de integração com partes de mim do passado, hoje, e o silêncio ao qual me
submeti até agora.
O ar faz a
conexão entre mundo interno e externo e eu estou aprendendo a respirar. A
médica perguntou há quanto tempo eu sentia falta de ar e eu me dei conta de que
desde a minha infância. Sim, desde a minha infância eu não respiro bem, mas só
agora tomo consciência disso. Hoje tenho 48 anos. Quando penso nisso, sinto uma
tristeza profunda, uma compaixão por mim mesma por ter chegado a este momento
só aos 48 anos. De outro lado, eu me contento, porque penso: que bom que eu
pude ver isso enquanto ainda havia tempo de mudar. Não há mais tempo a perder. Eu
quero viver, mais que nunca!!!
Não vou me
entupir de remédios, como a médica quis que eu fizesse. Os remédios
simplesmente tratam o sintoma, não a causa. Eles camuflam, escondem, entorpecem
as realidades profundas que precisamos acessar. A doença, como diz um livro que
amo, é um caminho, um caminho de autoconhecimento. A doença é uma mensagem, um
presente do corpo para a cura da alma. A doença faz parte da linguagem da alma.
Então, quero
olhar para isto, quero sentir a falta de ar e tomar consciência dela cada vez
mais. Quero olhar para esta criança do meu sonho, para as crianças da minha
sala de aula que anseiam por se expressar. Quero sentir a dor do mundo, a dor
dos seres que não podem falar, que não são ouvidos, que não são aceitos. Quero
olhar para aqueles que pensam não existir porque ninguém lhes enxerga. Quero
ver aquilo que não vi durante muito tempo. Quero me enxergar.
Escrito em 28/10/16
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